Isabel Viana

69 anos, Porto

«Lembro-me de um taxista que me bateu violentamente por trás, fui projetada uns metros… Disse-me “a senhora não devia andar de bicicleta”, “sabe que quem anda à chuva molha-se”. [...] Outro disse que se eu fosse um homem me “tratava da saúde”.»

Principal dificuldade

Usar vestidos ou saias compridas, além de lenços, é perigoso pois enrolam-se nas rodas ou nos pedais.

Conselho

Usar sempre capacete (independentemente do género) e nunca andar sem luzes ao crepúsculo ou à noite.

Qual a tua experiência em bicicleta na cidade?

O meu grau de experiência a usar a bicicleta na cidade é superior ao da maioria das pessoas. Desde o ano de 1980 (em Vila do Conde, com 25 anos) comecei a usar a bicicleta como meio de transporte usual. Mais tarde, no Porto ou em Matosinhos, continuei, e transportei durante alguns anos a minha filha para o infantário. Tornou-se um hábito rotineiro.

Fala-nos de como o teu género tem condicionado, ou não, essa experiência.

Não notei muito a influência do género. Noto por vezes que homens ou trabalhadores da construção civil dirigem-me frases machistas, elogiando as minhas curvas, por exemplo, às quais não ligo importância, pois vou concentrada na condução e na segurança.
Mas uma vez, um de dois homens jovens, no Porto, às 10 horas da noite, segurou-me na bicicleta impedindo-me de continuar a pedalar. Mas não desmontei e respondi de forma firme. Durante cerca de meio minuto foram trocadas algumas palavras desagradáveis. Notava-se que ele estava “pedrado” ou tinha bebido álcool em excesso. Queria ficar com a bicicleta… Tive de gritar alto que chamaria a polícia.
Foi o colega dele que acabou por o impedir de me molestar mais. Nunca mais o vi.
Mas não sei se foi por uma questão de género. Acho que se eu fosse um rapaz franzino talvez tivesse acontecido o mesmo.

Se consideras que tem condicionado, que situações viveste, ao usar a bicicleta, em que sentiste de algum modo desigualdade, insegurança ou falta de acesso pelo facto de seres mulher?

Já respondi a parte desta questão. Mas há muitas histórias. Lembro-me de um taxista que me bateu violentamente por trás (fui projetada uns metros e entortei o guiador com um joelho…). Disse-me “a senhora não devia andar de bicicleta”, “sabe que quem anda à chuva molha-se”. Tenho a certeza de que se eu fosse um homem ele teria reagido de outra maneira.
Noutra situação, um condutor disse-me para sair da frente, numa rua estreita. Outro disse que se eu fosse um homem me “tratava da saúde”. Enfim…Palavras que magoam antes de serem levadas pelo vento…

O que falta na tua perspetiva para que mais mulheres usem regularmente a
bicicleta como modo de transporte?

Faltam muitas coisas. Falta o respeito pela mulher, nova ou velha. Mas sobretudo, falta a segurança. Mais do que os homens, as mulheres precisam de mais ciclovias bem feitas, com bom piso, bem identificadas por sinais de trânsito, e seguras.

+ Histórias

Marisa Alves

54 anos, Gondomar, Porto

«O que se tem de gerir é o que qualquer mulher está habituada a fazer desde que se move pelo espaço público sozinha, evitando algum tipo de trajeto ou determinadas horas do dia. Mas isso, quer vá de bicicleta ou noutros modos. Ou seja, quanto mais seguro for o espaço público, mais mulheres andarão nele de todas as formas.»

Victória Clemente

12 anos, Belém, Lisboa

«Uso regularmente transportes públicos, e tenho sempre aquelas inseguranças e medos que nunca senti na bicicleta. Sinto-me muito mais segura na bicicleta do que em muitos transportes públicos.»

Beatrix Rencsisovszki

43 anos, V. N. Gaia, Porto

«Penso que no centro da cidade [do Porto] não conseguimos fazer infraestrutura suficiente para as bicicletas porque as ruas não são muito largas, mas podemos ensinar a ideia geral de que o mais vulnerável tem prioridade.»

Martha Branco

40 anos, Maia, Porto

«Sinto muitas vezes hostilidade e falta de respeito pelo nosso espaço nas ruas quando estamos na bicicleta. Então, digo que andar de bicicleta é um ato de amor e, principalmente, de resistência.»

Luzia Borges

49 anos, Dafundo, Lisboa

«Talvez sinta também condescendência por ser mulher, como se ser mulher fosse de uma fragilidade tal que é quase sinal de loucura andar na estrada — que “estão a pôr-se a jeito” e “depois não se queixem se forem atropeladas”.»

Maria Luísa Sousa

46 anos, Penha de França, Lisboa

«Viver numa zona movimentada dá-me o privilégio de, como mulher, me deslocar com mais liberdade do que se vivesse em zonas mais isoladas. No entanto, houve situações em que, ou pela hora, ou pela zona da cidade, já tive receio de a coisa poder não correr bem, e aí o facto de ser mulher conta.»

Catarina Domingues

41 anos, Lisboa

«Há menos mulheres [do que homens] a andar de bicicleta porque a maioria das tarefas domésticas e responsabilidade com os filhos ou outros familiares ainda são unicamente ou em grande parte responsabilidade das mulheres.»